Publicado em 29/03/2016 as 10:14am
Aos 86 anos primeira juíza da Suprema Corte dos EUA cria games
Agora, ela pode acrescentar à lista uma realização digna da era digital: produtora de games.
A juíza Sandra Day O'Connor, que completou 86 anos no sábado (25), tem muitas realizações de que se orgulhar, entre as quais sua passagem pelo Senado estadual do Arizona e sua posição como primeira mulher indicada para a Suprema Corte federal norte¬americana, posto que ela ocupou por um quarto de século.
Agora, ela pode acrescentar à lista uma realização digna da era digital: produtora de games.
O'Connor está por trás de um jogo de educação cívica via animação chamado "Win The White House", cuja mais recente edição acaba de ser lançada. O jogo já foi jogado por mais de 250 mil estudantes, até este mês, e vem ganhando espaço nas escolas de ensino fundamental dos Estados Unidos.
No jogo –que acompanha o ciclo da atual campanha presidencial–, os estudantes assumem o papel de candidatos imaginários à presidência que precisam aprender a competir contra seus adversários sem perder a civilidade, ainda que estes tenham posições antagônicas com relação a questões como a imigração e o controle de armas.
Parece inesperado que O'Connor tenha se tornado uma entusiasta dos jogos interativos. Até alguns anos atrás, ela nem mesmo tinha visto, quanto mais jogado, um videogame.
"Eu era um daqueles adultos que não se educam", brincou O'Connor . Falando sobre o objetivo didático de "To Win the White House", ela explicou que "precisamos ter um sistema que permita que os jovens abordem a solução de problemas observando¬os de muitos pontos de vista diferentes".
COMO FUNCIONA UM GOVERNO
O'Connor se envolveu com os jogos digitais depois de se aposentar da Suprema Corte, em 2006. Ela criou a iCivics, uma organização cívica sem fins lucrativos, em 2009. De lá para cá, a organização lançou 19 jogos on¬line gratuitos, acompanhados por planos de estudo, com a ideia de tornar a educação cívica menos dependente de decorar fatos e mais associada a propiciar aos alunos um Compartilhar 14 Mais opções vislumbre animado de como os diferentes ramos do governo e da constituição funcionam. Cerca de 3,2 milhões de estudantes jogaram jogos da iCivics no ano passado, a organização informou.
O'Connor está envolvendo seus colegas no esforço, além disso. A juíza Sonia Sotomayor entrou para o conselho da Civics em novembro.
Em entrevista por telefone na sexta¬feira, Sotomayor disse que em sua opinião era "brilhante que a juíza O'Connor compreenda que os jogos de computador podem ser uma boa maneira de interessar as crianças em educação civíca". Sotomayor, juíza da Suprema Corte, disse ter desenvolvido seu interesse especial pela lei assistindo à série de TV "Perry Mason", e contou ter incorporado o iCivics às suas frequentes visitas a escolas, nas quais ela encoraja os alunos a aprender como funciona o governo e a se envolverem com suas comunidades.
"Achei que isso realmente acompanhava bem a minha mensagem aos garotos sobre a maneira pela qual as leis os afetam a cada dia", disse Sotomayor, acrescentando que ela mesma já jogou os títulos da iCivics. "São divertidos. Desafiei meus assessores na corte a jogá¬los, para ver como se saem".
O envolvimento das duas juízas em jogos digitais educativos sublinha a crescente crença entre os educadores de que ferramentas interativas podem promover maior engajamento dos estudantes com o seu aprendizado. Em janeiro, a Microsoft lançou uma versão educacional do "Minecraft", jogo de sucesso no qual os participantes usam blocos para construir elaborados mundos virtuais. No final do ano passado, o Google lançou o Expeditions, um sistema de realidade virtual para uso em salas de aula, cujo objetivo é levar os estudantes em viagens de classe simuladas a diversos lugares do mundo.
Os professores que usam o "Win the White House" disseram que o jogo ajuda seus alunos a experimentar e compreender os complicados compromissos que os candidatos à presidência muitas vezes precisam aceitar.
Anna Nelson, diretora assistente da Bronx Latin, uma escola secundária na cidade de Nova York, recentemente dividiu sua turma de educação cívica da 12ª série em equipes democrata e republicana, e lhes deu a tarefa de jogar o jogo. Ao longo do caminho, os alunos aprenderam a diferença entre convicções políticas conservadoras e progressistas, e que os candidatos precisavam se aferrar às plataformas que escolheram, ela disse. Eles também aprenderam a selecionar companheiros de chapa de origens diferentes, a fim de ampliar seu apelo junto aos eleitores.
"O jogo lhes ensina tanta coisa, em uma só simulação curta", disse Nelson. Agora, quando chegam à aula, eles querem discutir com ela os desdobramentos reais na disputa das primárias, conta a professora.
Sotomayor sugeriu que os pais também podem jogar com os filhos. "Você faz ideia de quantos adultos sabem coisa nenhuma sobre civismo?", ela disse.
FORMAÇÃO DE LÍDERES
O'Connor disse ter criado a iCivics por preocupação de que muitas escolas tenham abandonado seus esforços para ensinar os alunos a se tornarem cidadãos engajados. Ela diz se preocupar com a possibilidade de que os alunos cresçam sem se tornar bons líderes, ou mesmo eleitores ativos, se eles não compreenderem, por exemplo, a importância de um judiciário independente, ou o direito à lisura processual.
"Um quarto dos alunos não consegue demonstrar conhecimento proficiente de como nosso governo funciona", disse O'Connor, "mas seu conhecimento de programas de TV como 'American Idol' é muito alto".
Ela disse ter começado a estudar a sério a ideia de jogos educacionais depois de consultar James Gee, professor de estudos da alfabetização na Universidade Estadual do Arizona e autor de um livro sobre como os videogames podem ajudar na alfabetização.
"Expliquei a ela que os jogos não eram sobre atirar em pessoas", disse Gee, "mas sobre resolver problemas".
A Filament Games, produtora de jogos para aprendizado em Madison, Wisconsin, entre cujos fundadores está um antigo aluno de Gee, desenvolveu os jogos da iCivics, sediada em Cambridge, Massachusetts. As paixões e prioridades pessoais de O'Connor foram centrais para o desenvolvimento de alguns jogos, entre os quais Supreme Decision, no qual os estudantes assumem o papel de um juiz imaginário da Suprema Corte que terá de dar o voto decisivo em um processo.
Em um dos jogos mais populares da iCivics, chamado "Do I Have a Right", os alunos são advogados de um escritório especializado em direito constitucional, aceitando clientes, descobrindo que direitos se aplicam a eles e defendendo seus casos.
Ainda que o jogo não tivesse a capacidade de antecipar recentes questões contenciosas como a disputa entre a Apple e o Serviço Federal de Investigações quanto ao desbloqueio de um iPhone, ele cobre tópicos que podem oferecer aos estudantes percepções sobre atualidades ou suas próprias experiências.
"Governo não é um conhecimento transmitido geneticamente", disse O'Connor. "Precisa ser ensinado a cada geração.
Fonte: uol.com.br