Publicado em 16/09/2020 as 6:30pm
Coluna Wendel Stein
A caixa radioativa? No começo dos Anos 90, depois de tanto ler sobre astronomia e coisas...
A caixa radioativa?
No começo dos Anos 90, depois de tanto ler sobre astronomia e coisas inexplicáveis, decidi tornar-me ufólogo. Ufólogo é o pesquisador de Objetos Voadores não-identificados. Primeiro reuni alguns conhecidos que gostavam do assunto e criei o Grupo de Estudos e Pesquisas Exobiológicas Aquarius I, com o qual realizávamos reuniões na Associação Comercial de Sumaré, onde conversávamos sobre o assunto, além de editar um fanzine sobre Ufologia. Em uma época pré-internet, os fanzines (cópias datilografas e fotocopiadas) eram a melhor maneira de trocar informações com outros entusiastas do Brasil.
Lógico que era uma coisa amadora, a única publicação que existia era a Revista UFO, editada por A. J. Gevaerd, e as matérias que periodicamente eram publicadas pela revista Planeta, ambas respeitadas por todos. Eu tinha 16 anos na época, prestes a completar 17, quando fui apresentado aos irmãos Mondinis. Eles eram irmãos gêmeos que há vários anos pesquisavam o fenômeno, com instrumentos de análise que eu nunca tinha visto pessoalmente. Eles tinham contato com grandes grupos do Brasil e exterior, inclusive com o editor da Revista Ufo.
Comecei a acompanhá-los nas reuniões que eles faziam no quintal da casa de Osvaldo Mondini, e os ajudavam quando faziam palestras em escolas, falando sobre ciência, astronomia e ufologia. Ajudava como operador de slides, achava que isso era uma coisa importante, tanto que, nesses dias, colocava um jaleco branco e óculos de grau dourado. Eu parecia um verdadeiro cientista louco saído daqueles desenhos animados do pica-pau.
Com o tempo, fui aprendendo um pouco mais de ufologia, as formas de fazer pesquisa, e conheci vários casos importantes. Eu tinha certeza de que Discos Voadores existiam.
Um dia fui convidado para participar de uma investigação de campo de um caso ufológico. Foi um dos momentos mais importantes da minha vida, até então. O caso era mais ou menos o seguinte: no interior de São Paulo, há semanas, várias luzes estranhas eram avistadas, objetos e fenômenos estranhos eram registrados em fotos e vídeos. A maioria desses relatos e informações chegavam em primeira mão ao grupo, pois eles já tinham uma boa fama no Brasil e, por isso, as pessoas e jornais entravam em contato com eles quase em tempo real.
O caso que investigamos foi apelidado de O Caso Limeira. Várias pessoas foram testemunhas de estranhas luzes, blackouts e barulhos estranhos. No bairro onde houve o maior número de avistamentos, um morador encontrou, no quintal de sua chácara, um imenso círculo esculpido na grama.
Na manhã seguinte, seguimos para a cidade. O dono da chácara nos esperava, e vários importantes ufólogos do Brasil estariam lá.
Foi quando conheci pesquisadores que foram base para minha formação na área: Marcos Silva, Claudeir Covo, Wallacy Albino, todos eles já falecidos.
Quando chegamos à chácara, uma multidão de curiosos esperava do lado de fora. Entramos na área gramada e lá estava a marca. Era um círculo de cerca de um metro e meio de diâmetro. A grama estava queimada na volta, mas não por fogo. Era como se estivesse submetida a uma temperatura muita baixa, e todas as gramas estavam baixadas no mesmo nível.
Claudeir Covo observava mais atentamente e percebeu que em volta do círculo havia três marcas idênticas.
“Marcas de trem de pouso”
Então, Marcos Silva decidiu fazer um molde em gesso da marca. Osvaldo foi mais perspicaz e disse:
— Vamos cavar com cuidado e tirar a marca inteira. Se for verdade, teremos a primeira marca de pouso de um UFO.
No começo das pesquisas de campo de ufologia, não havia muita metodologia, estávamos aprendendo juntos e errando juntos. Não havia internet, fotografia digital, computadores avançados. Entrevistamos vários moradores, que relataram o mesmo objeto brilhante no céu, e um estranho blackout, que fez o bairro ficar sem eletricidade por cerca de 20 minutos.
Um pouco depois do meio dia, acompanhamos Claudeir até a emissora de rádio local onde ele deu uma entrevista. Após, seguimos para o principal restaurante da cidade. O ambiente sempre era ótimo, Claudeir e Marcos Silva eram ótimos contadores de piadas.
No final do dia, voltamos para Sumaré, onde paramos em frente à minha casa. Lá cada um iria seguir caminho para suas próprias cidades. Era uma caravana de vários jipes que chamavam a atenção por onde passavam.
Claudeir fez questão de conhecer meus pais, onde tomou café, ouvindo a história deles de como começaram na lavoura de tomate. Minha casa era um sobrado, e eu tinha pegado a biblioteca que existia no andar de baixo e fiz de lá meu quarto e quartel general de pesquisas há alguns meses.
Então, Eduardo chegou para mim e disse:
— Vou deixar a amostra do pouso aqui com você, no seu quarto. O Osvaldo vai levar as amostras colhidas hoje ainda, para que um amigo examine na Unicamp.
Concordei e minutos depois nos despedimos. Foi um dia longo e cansativo. Custou-me pegar no sono, pois eram muitas informações e pessoas novas que conheci. Estava muito empolgado com tudo.
O dia chegou sem sol, tudo estava nublado. Era uma segunda-feira como qualquer outra. Levantei, lavei o rosto, escovei os dentes e sentei na frente do computador. Na hora que fui acender a luz, um chiado e a lâmpada queimou. Quando liguei o computador, o mesmo chiado, e ele ligou com imagens estáticas, como se o HD tivesse sido apagado. A única coisa que veio à minha cabeça ao olhar a caixa com a marca do pouso da nave:
“RADIAÇÃO”
Tentei ligar para Eduardo, mas o telefone sem fio não pegava. Liguei pelo telefone com fio e ele atendeu:
— Eduardo, pelo amor de Deus, me ajuda.
— O que foi? Fala com calma.
— A luz queimou, o computador está com o HD apagado, o telefone sem fio não funciona... Caixa, radiação.
Ele tentou me acalmar. E disse:
— Aguenta aí, vou ligar para o Valter, o meu amigo da Unicamp para quem enviei as amostras. Na realidade, você quer ligar?
Na mesma hora liguei e expliquei o ocorrido. Ele tinha ficado de plantão nas últimas 24 horas e estava exausto. Ele não me tranquilizou:
— Bem, garoto. Parece que as amostras estão radioativas.
“Morri” — pensei.
— E o que eu tenho que fazer?
— Aguenta uns minutos aí, me passa seu telefone que vou pegar as amostras que o Osvaldo deixou comigo e vou verificar de novo. E ligo em seguida.
— Mas o que eu faço se der positivo?
— Bem, ser der positivo, você vai ligar para este número que tenho do exército. Provavelmente toda a casa e rua serão isoladas.
Ele desligou o telefone.
Juro por Deus que foram os 15 minutos mais loucos da minha vida. Deu dor de barriga, fui ao banheiro três vezes, e mesmo a diarreia sendo de desespero, achava que era por causa da caixa radioativa. Todo os meus 16 anos de vida passaram como um flash instantâneo, coisas que fiz e coisas que deixaria de fazer. Imaginei toda a minha família exposta em rede nacional. Seria a vergonha trágica mais comentada na história da cidade.
Então, quando o telefone tocou, quase meia hora depois, atendi e tive que sentar no chão, pois as pernas estavam moles demais para eu parar em pé. Era o cientista da Unicamp.
— Garoto, é você?
— Sim. Sou eu.
— Boa notícia. O material não apresentava nenhum tipo de radiação nociva, apenas a que indicava queima por alta temperatura. Não tem nada radioativo com você, apenas uma caixa com terra e grama.
Do mesmo jeito que estava sentado, deitei no chão e fiquei lá por mais de 30 minutos, imóvel. Nem sequer me despedi do cientista.
E o computador, o telefone sem fio e as luzes?
Tinha sido tudo uma grande coincidência. O computador estava funcionando normalmente, tinha tido só um problema na sua reinicialização, pois ao testá-lo de novo estava funcionando, assim como o telefone sem fio. A lâmpada estava queimada pelo longo tempo de uso. Só depois disso aprendi que mesmo a radiação não afetaria computadores, telefones e nem lâmpadas.
Esses acontecimentos me afastaram da ufologia por algum tempo. A partir daquele momento, decidi que era necessária uma metodologia mais abrangente e multidisciplinar para se lidar com o assunto. O profissional tinha que ter a abordagem jornalística e o método científico de apuração. Em locais de pouso, equipamentos adequados, como contador Geiger, luvas e roupas de proteção. No caso do pouso de Limeira, não havia radiação. Mas e se o que tivesse acontecido lá fosse a queda de um satélite que tivesse algum combustível radioativo? Foi a chamada sorte de amador.
Foi a época com grande aparição de fenômenos no Brasil, que alcançou seu ápice com o Caso Varginha. Algo que sempre acreditei estarem ligados, os casos de avistamentos e o fenômeno ocorrido em Minas Gerais.
Esta foi a história do Caso Limeira e da caixa radioativa. Como diria o poeta, um dia cada vez mais interessante do que o outro.
Wendell Stein é jornalista, cineasta, escritor profissional e colunista do Brazilian Times. E-mail: wendellstein@me.com
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Fonte: Redação - Brazilian Times.