Publicado em 30/03/2025 as 10:00am
Coluna Cataldi: Entre Circuitos e Consciência
Estamos na década mais disruptiva da história moderna. A Inteligência Artificial, que até...
Estamos na década mais disruptiva da história moderna. A Inteligência Artificial, que até pouco tempo atrás habitava o imaginário da ficção científica, hoje escreve textos, compõe músicas, pinta quadros, diagnostica doenças, toma decisões logísticas e até interpreta emoções humanas com crescente precisão. Diante dessa revolução silenciosa e inexorável, surge essa pergunta tão antiga quanto a própria filosofia, ecoando Platão, Aristóteles e Heráclito nas ágoras da Grécia Antiga: o que nos torna humanos?
A IA tem desafiado nossas definições mais profundas de criatividade, originalidade e até consciência. Se uma máquina é capaz de compor uma sinfonia que emociona, de redigir um poema que consola ou de argumentar com lógica refinada, será que ainda somos os únicos autores da beleza e da razão? Se algoritmos podem reproduzir com exatidão o comportamento humano, onde reside a essência da alma?
A resposta talvez não esteja apenas na capacidade de criar, mas na capacidade de sentir, com nossa humana imperfeição, contradição e intuição. A inteligência artificial pode prever comportamentos com base em dados, mas não conhece o sabor da saudade, o arrepio da dúvida, a vertigem do amor ou a delicadeza do perdão. Em outras palavras, a IA pode simular sentimentos, mas não os vivencia.
Esse novo tempo nos convida a um reposicionamento existencial. Ao mesmo tempo em que delegamos funções à tecnologia, devemos assumir com mais vigor o papel de guardiões do sentido, do afeto, da ética e do propósito. A alma humana, essa entidade imensurável que se expressa na arte, na espiritualidade, na empatia e na esperança, permanece como o ponto de origem — e talvez também o de chegada — de toda transformação tecnológica.
Nas escolas, por exemplo, a IA pode ensinar com eficiência. Mas apenas um professor humano pode perceber o brilho no olhar de um aluno ao compreender um conceito, ou estender a mão quando esse olhar se apaga. No sistema de saúde, um algoritmo pode identificar tumores com precisão milimétrica. Mas não pode oferecer um ombro acolhedor ao paciente que recebe um diagnóstico difícil.
Portanto, enquanto máquinas evoluem em capacidade, nós devemos evoluir em humanidade. Seremos cada vez mais desafiados a desenvolver competências que não podem ser codificadas: escuta ativa, empatia autêntica, pensamento crítico, sensibilidade ética e compaixão. Essas serão as habilidades raras do futuro, e paradoxalmente, as mais humanas.
A tecnologia não é um fim, mas um espelho. E o reflexo que ela nos devolve depende da intenção com que a usamos. Cabe a nós garantir que, mesmo cercados por inteligência artificial, sejamos movidos por sabedoria genuinamente humana.
Afinal, quando tudo for algoritmo, ser alma será o verdadeiro diferencial.
Claudia Cataldi é Jornalista e Professora de Qualidade no Serviço Público da Pós Graduação da ELERJ - Escola do Legislativo do Estado do Rio de Janeiro