Publicado em 27/06/2018 as 4:00pm
Acusada de entrada ilegal, brasileira processa EUA para ter filho de volta
Com catapora, Diogo passou 9º aniversário em solitária em abrigo; Lidia, que só pode falar com ele duas vezes por semana, tem apoio de advogados e vaquinha.
No fim de maio, a brasileira Lidia Karina Souza foi acusada de entrar ilegalmente nos EUA junto com o filho, Diogo, e acabou algemada e detida pela Imigração. Quando foi solta, foi separada do menino, então prestes a fazer 9 anos — como parte da política de tolerância zero de Trump com a imigração, que, ao processar criminalmente os adultos e levá-los para presídios, leva à separação de pais e menores de idade na fronteira.
Lidia Souza está na região de Boston, e o filho, em um abrigo em Chicago. Em contato telefônico com Diogo apenas duas vezes por semana, ela teve seu caso assumido por uma firma de advocacia pró-imigrantes. Agora, contando também com o apoio de uma vaquinha para ajudá-la financeiramente, está processando o governo para ter o filho de volta.
— (As autoridades) Assumiram controle da criança como se fossem seus pais ou como se ele fosse órfão — disse ao "Boston Globe" Jesse Bless, advogado da firma de advocacia Jeff Goldman, que assumiu o caso de Lidia de maneira pro bono (sem cobrar honorários).
O processo para reunir as famílias, segundo a imprensa local, está sendo impetrado em um tribunal de Chicago, onde o menino está em um abrigo para menores imigrantes gerido pela ONG Heartland Alliance.
O GLOBO tentou entrar em contato com o advogado e com a Heartland Alliance para esclarecer respectivamente a situação que motivou o pedido de asilo de Lidia e como Diogo está abrigado, mas não obteve retorno de ambos até a última atualização. Lidia deu entrevistas ao "Globe" e ao "New York Times" nos últimos dias, antes de o escritório de advocacia centralizar demandas sobre seu caso em uma assessoria de imprensa.
Em 29 de maio, Lidia atravessou legalmente do México aos EUA com Diogo. Tinha permissão do Departamento de Segurança Interna para pedir asilo. Ao alegar medo de perseguição e violência em uma agência do Escritório de Imigração e Alfândega (ICE) na divisa dos estados do Novo México e do Texas, no entanto, foi acusada de entrar ilegalmente no país. Um agente disse a ela, segundo o advogado, que como Lidia não se apresentara em um ponto de entrada oficial, tinha cometido uma irregularidade.
Segundo Bless, Lidia aparentemente teria sido coagida pelas autoridades imigratórias — sem entender inglês — a assinar um documento admitindo culpa, para que enfim pudesse voltar a ver seu filho. Ela nunca recebeu uma cópia do papel assinado. Levada para um tribunal federal em El Paso, foi condenada pela infração de entrada ilegal, um delito de menor ofensa legal.
— Temos casos de menores brasileiros que continuam em abrigos por causa de novas exigências, que acabam intimidando os parentes que queriam levá-los para casa — afirmou ao "Times" Luiza Lopes, diretora do Departamento Consular de Brasileiros no Exterior do Itamaraty.
Lidia acabou solta dias depois, sob a promessa de que aguardaria na casa de parentes na região metropolitana de Boston — apenas para descobrir que tinha sido separada de Diogo, que acabou no abrigo provisório em Chicago. As cidades, respectivamente nos estados de Massachusetts e Illinois, estão a 1.300 quilômetros de distância.
ANIVERSÁRIO EM ISOLAMENTO
Só com o caso assumido por advogados e após passar semanas sem notícias do filho, Lidia acabou descobrindo que ele estava no abrigo. Quase um mês depois, ela só tem aval para falar com ele duas vezes por semana, por telefone. O menino passou o nono aniversário numa solitária: tinha contraído catapora, e por isso acabou isolado das outras crianças.
— Não chore. Quero que você fique bem. Por favor seja forte. Está bem, filho? Fique com Jesus, meu filho. Tchau. Eu te amo — disse ela a Diogo no aniversário do menino, numa ligação cujo áudio foi obtido pelo "New York Times".
O apoio legal a Lidia vem da Immigrant Avenues, uma sociedade limitada vinculada ao escritório de advocacia de Goldman. Na sexta-feira, a firma lançou uma vaquinha online para cobrir outras despesas de Lidia, como a ida a Chicago, uma eventual reunião com Diogo e um local para ficar enquanto pede asilo político num dos cerca de 60 tribunais de imigração do país. De uma meta de US$ 10 mil, até a noite desta segunda-feira já haviam sido arrecadados quase US$ 3 mil.
Enquanto os advogados tentam reaver o menino e colhem informações para determinar exatamente como ela acabou acusada de entrar ilegalmente pelo ICE, existe a possibilidade de que a burocracia e as montanhas de papeladas que ela precise preencher possam atrasar o reencontro em até meses.
— Isto não é uma política de tolerância zero. É de pensamento zero — afirmou Goldman, citado pela rádio WBUR, afiliada local de Boston da Rádio Pública Nacional (NPR) americana.
Fonte: Redação - Brazilian Times