Publicado em 7/08/2018 as 8:44am
Estudo mostra que planeta pode virar uma estufa e que não há muito mais a se fazer para evitar
Estamos num limite muito perigoso, prestes a empurrar o planeta para um aquecimento contínuo,...
Estamos num limite muito perigoso, prestes a empurrar o planeta para um aquecimento contínuo, uma espécie de “Estufa Terrestre”, mesmo se e quando as emissões de gases poluentes forem reduzidas. Esta é a conclusão de mais um estudo de cientistas que empregaram seu tempo para pesquisar as mudanças climáticas, consideradas por eles “uma das questões mais existenciais da Ciência hoje”. O resultado foi publicado no jornal “Proceedings of the National Academy os Sciences of the United States of America" e reproduzido no “The Guardian”.
O estudo está sendo divulgado em meio a uma forte onda de calor que está alarmando a Europa, onde houve a ameaça de que as temperaturas chegassem a 48 graus no fim de semana que passou. Mas, se a um só tempo é extremamente importante que se dê atenção a mais um alerta gigante feito por quem entende e sabe das coisas no mundo do clima, por outro pode ser apenas “mais um estudo”, que vai ganhar um nicho de “coisas para lembrar depois” em vez de ser capaz de nos fazer mudar de hábitos. Este é o perigo.
Tem detalhes novos neste relatório, como por exemplo a descoberta de que o aumento das chuvas – um sintoma das mudanças climáticas – está tornando mais difícil para os solos das florestas capturarem gases do efeito estufa. Atualmente, as temperaturas médias globais estão um pouco acima de 1C dos níveis pré-industriais e subindo a 0,17C por década. O acordo climático de Paris estabeleceu ações para manter o aquecimento limitado a 1.5 a 2 graus até o final do século, mas os autores do estudo alertam que medidas mais drásticas podem ser necessárias. E dão como exemplo, justamente, o calor danado que está assolando a Europa. Pode ser muito pior nos próximos anos, caso a temperatura da Terra fique 1.5 graus mais alta.
Pois então... o que fazer?
Gosto da provocação de Naomi Klein, jornalista canadense, autora de vários livros sobre o tema, entre eles “This Changes Everything” e “The Shock Doctrine” , que se tornou ativista ambiental reconhecida no mundo todo. Embora faça uma análise crua sobre os fatos apresentados pelos cientistas do clima, Klein tem uma visão otimista, porque acredita que podemos aproveitar essa crise existencial para “transformar nosso sistema econômico e construir algo radicalmente melhor”.
A mudança tem que ser mesmo radical, acompanhando o tamanho da ameaça que paira sobre nossas cabeças. Talvez a que mais bem se adapte atualmente seja, justamente, parar de negar o que está sendo mais do que provado. A partir de uma consciência que nos ponha num caminho mais perto da natureza, pode começar a ficar um pouco mais fácil entender que é possível tentar mudar. Certamente não vai dar para desligar para sempre os aparelhos de ar condicionado, dos quais nos tornamos dependentes até por causa do aquecimento. Mas podemos combinar mais momentos de vida ao ar livre, com roupas mais leves, horários diferentes de trabalho.
Busquei em outra fonte mais ideias que possam nos ajudar a ir montando um mosaico para o tremendo quebra-cabeça que se forma diante de pessoas sensíveis à causa. No livro “Climate change, capitalism, and corporation” (ainda sem tradução) os professores Christopher Wright e Danie Nyberg lembram o importantíssimo papel das grandes empresas em nossa labuta para conseguir novas políticas climáticas.
“Por um lado, elas são as principais agentes na produção de gases poluentes e, por outro, são vistas também como nossa grande esperança em reduzir as emissões através de inovações tecnológicas”, dizem os autores. Por causa desse duplo papel, os dois focaram seu estudo em grandes empresas, entrevistando mais de 70 CEOs.
Na conclusão do livro encontro algumas reflexões que podem nos ajudar. Eles sugerem que pode haver seis caminhos para que se consiga ampliar o debate e imaginar mudanças.
O primeiro caminho proposto pelos professores é que se tire o meio ambiente de um nicho menos importante, por exemplo, do que a economia ou as questões sociais. É preciso que se amplie o debate, enxergando sempre as possíveis variáveis ambientais em todos os setores da vida. Como diz Naomi Klein, o aquecimento global e as possíveis formas de se conviver com ele tem a ver tanto com gases poluentes como com o capitalismo, sistema econômico que precisa rever seriamente seu jeito de fazer negócios.
Depois disso, Christopher e Daniel sugerem que se tenha uma narrativa totalmente diferente da atual, que vê riscos e oportunidades nas mudanças climáticas. Vai ser fora da corrente econômica e dos discursos de negócios que se vai encontrar uma linguagem que nos ponha mais frente a frente com as mudanças que precisamos fazer. O clima, cada vez mais, vai nos colocar perguntas duras sobre nossa relação com o ambiente natural e, ao fazê-lo, vai nos forçar a ter uma percepção diferente da maneira como lidar com ele. Longe do “business as usual”, portanto.
Há coisas mais importantes e urgentes, lembram os dois, que as grandes corporações podem fazer muito antes de estabelecer um preço para o carbono. O que é preciso é apoiar uma forma direta e eficaz de democracia, de envolvimento dos cidadãos.
Dar preço, em valores monetários, ao meio ambiente – como se vê em propostas de mercado de carbono ou da economia verde – vai transformá-lo em “um” valor. Uma outra forma é aumentar nosso respeito pelo planeta, reconhecendo sua pluralidade, percebendo que há sempre uma relação ecológica. Muito mais do que, apenas, uma construção de utilidade humana para o meio ambiente.
Os professores cutucam nosso posicionamento ao comprar produtos ecológicos, alertando para o modismo que pode haver atrás dessa atitude. É preciso ir além e ter trabalho, juntar crença com ação. Recusar o modismo do “consumo verde” pode ser um trampolim para que se faça uma análise profunda de nós mesmos como cidadãos num mundo em que o clima já mudou.
Por fim, Daniel e Christopher lembram que não têm a solução para o problema da mudança climática, que não há uma bala de prata. O que eles esperam é que os danos sejam menores do que aqueles que os cientistas estão apontando, É preciso, ao menos, tentar.
Fonte: g1.globo.com