Publicado em 27/09/2018 as 6:00pm
Carta assinada por Galileu em 1613 é encontrada por historiador por acaso
No século XVII, obviamente, não havia a facilidade comunicativa que dispomos atualmente, de...
No século XVII, obviamente, não havia a facilidade comunicativa que dispomos atualmente, de forma que cartas precisavam ser escritas à mão — mais de uma vez, caso houvesse mais de um destinatário — e entregues pessoalmente por mensageiros, sem nenhum tipo de segurança em relação à privacidade da mensagem enviada. Por essa razão, acreditava-se que alguém poderia ter alterado o conteúdo da carta que Galileu Galilei escreveu em 1613, ainda no início de suas disputas com a Santa Inquisição Católica, deixando a opinião do astrônomo ainda mais dissidente do que a Igreja exigia que fosse pregado, a fim de colocar Galileu em problemas.
Entretanto, o historiador científico Salvatore Ricciardo encontrou acidentalmente no acervo da The Royal Society uma carta de sete páginas escrita pelo próprio Galileu que permite a interpretação oposta: talvez Galileu tenha rasurado ele mesmo as mensagens para tornar o conteúdo mais suave e menos pecador aos olhos da Igreja, visando salvar seu próprio pescoço.
"Eu pensei: eu não posso acreditar que eu descobri a carta que praticamente todos os estudiosos do Galileu acreditavam estar completamente perdida", diz Ricciardo. “Parecia ainda mais incrível porque a carta não estava em uma biblioteca obscura, mas na biblioteca da Royal Society.”
Tudo começou quando a grã-duquesa Cristina, que tinha a astronomia como um hobby, perguntou ao matemático e professor da Universidade de Pisa, Benedetto Castelli, se a Terra era mesmo o centro do Universo, tendo a resposta afirmativa que era exigida pelo alto clero na época. Entretanto, Castelli, que fora aluno de Galileu Galilei anteriormente, acabou tocando no assunto com o seu antigo professor, que escreveu a tal carta para Castelli em 21 de dezembro de 1613. No documento estavam informações que mais tarde, sem a intromissão da religião nas ciências, seriam provadas certeiras, como o fato de que a Terra é quem gira ao redor do Sol, não o oposto. Já em 1615, Galileu enviou uma versão da mesma carta à própria grã-duquesa Cristina, afirmando a hipótese heliocentrista.
A mensagem foi interceptada pelo frade dominicano Nicolò Lorini, que foi injustamente acusado de agravar os posicionamentos de Galileu durante todos esses anos, até a descoberta do historiador Ricciardo. Duas décadas depois, as cartas de Galileu foram apresentadas pela Santíssima Inquisição como prova de heresia, pecado que levou o gênio a ser condenado à prisão domiciliar pelo resto de seus dias, já em 1633.
A visão pessoal de Galileu, que era católico, era que alguns trechos da Bíblia não deveriam ser interpretados ao pé da letra quando o assunto era o movimento dos astros. Copérnico já havia apresentado o modelo heliocentrista no século XVI e Galileu afirmava que as escrituras sagradas passaram por um processo de simplificação pelos escribas com intuito de facilitar a compreensão do público, e fugir da perseguição aos cristão em Roma.
Com intuito de diminuir as acusações de heresia contra si, Galileu entregou ao seu amigo e clérigo Piero Dini uma versão mais sutil e mansa da carta. Dini possuia alguma influência política e chegou a tentar defender Galileu frente à Inquisição, mas sem sucesso. O astrônomo morreu em Florença, em 1642, em sua casa, cumprindo a pena por ser um herege.
Fonte: Nature